quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

A guardiã e as lagostas no deserto


Todos viviam em agonia. De dia caçavam o que comer, destruíam o quase nada que encontravam e assim, sem o mínimo senso de coletividade ou prosperidade, levavam-se à ruína e toda a sua geração.

Os animais silvestres, os que sabiam se defender, não se deixavam matar, mas também passavam sufoco e era inevitavel morrer de alguma forma.

À noite todos não conseguiam dormir, pois a fome e o desespero os atormentavam lembrando que no dia seguinte só um milagre poderia salvá-los. Não clamavam por um ser divino, apesar de poderem ver a qualquer momento o céu e o horizonte - mais grandiosos e divinos do que poderiam imaginar.

Naquele deserto, a vida foi regida dessa forma durante muitos anos.

Eram várias populações, cada qual vivia em sua tribo. Havia ciganos, índios, boiadeiros (?), magos, odaliscas, negros, brancos, caboclos e até reis. Todos perdidos, sem seus tesouros e sem ter como nem onde usar suas respectivas sabedorias.

Até que um dia apontou no cume de uma duna daquela região um tropel de lagostas. Elas vinham de longe, convictas de sua caminhada e de seu destino. Uma mulher, provavelmente uma cigana guardiã - também faminta -, as acompanhava desde muito longe, às escondidas, para que aqueles animais suculentos não se assustassem, se dispersassem de seu caminho ou fossem atacados por outros seres famintos.

Os animais silvestres da região pararam, se assustaram com o que viam e apenas observaram as lagostas passarem. Os habitantes das diversas tribos também se espantaram, ficaram impressionados ao verem lagostas no meio do deserto. Então a cigana guardiã se aproximou deles e explicou:

"Quando vires algo exótico, valioso, suculento e impressionante passar em meio ao deserto em que tu vives, respeita e não ataca. Segue-o porque lá no fim, no destino final, te surpreenderás com o que irás encontrar!"

E assim todos os ciganos, índios, boiadeiros (?), magos, odaliscas, negros, brancos, caboclos e até os reis acompanharam as lagostas durante meses, alimentando-se do pouco que conseguiram reservar enquanto penavam parados e perdidos no deserto.

O horizonte areado parecia não acabar quando, de repente, uma montanha esverdeada foi surgindo. Aos pés dela, um córrego de água doce e cristalina molhava o solo com vigor. Quanto mais perto chegavam, mais cheias e torrenciais corriam aquelas águas.

As lagostas seguiram seu rumo pela água. A guardiã pediu para que a população aguardasse a uma certa distância. Na beira do rio havia um homem, que logo chamou aquela mulher misteriosa:

- Cumpriste vosso dever, mas por que trouxeste essas pessoas miseráveis?
- Ora, não vês que eles estão morrendo de fome? Não tive escolha. Perdoe-me.
- Tudo bem, filha. Tuas boas ações só me enchem de orgulho!

Uma cidade foi construída ao redor do rio. Todos eles: ciganos, índios, boiadeiros (?), magos, odaliscas, negros, brancos, caboclos e até os reis viveram em harmonia, cada qual em seu território, mas todos a compartilhar tudo o que encontravam ou produziam.

O homem e a guardiã foram embora, mas vez ou outra enviam uma daquelas lagostas para vigiar a harmonia daqueles povos que outrora viviam em guerra e perdidos no meio do deserto.

Este texto surgiu em um sonho que eu tive de ontem para hoje. Certamente ele cai como uma luva na vida de alguém. Será que você se identifica em algum dos personagens? E a sociedade em que tu vives, será que está em agonia? Para um pouco, reflete e segue adiante.

Bom dia!

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